X Assembleia da Organização Regional do Algarve

A situação da justiça no Algarve, o ataque ao regime democrático e o papel dos democratas e patriotas, Mário Cunha

Faro, 10 de Dezembro de 2022

face Mario Cunha

 

Camaradas,

Não será complicado perceber que se uma classe monopoliza os meios de produção, adquire uma posição de tal predomínio no processo económico, que leva a que sejam os seus interesses que passam a governar a sociedade inteira. Reflectindo esse estado de coisas, o Direito converte-se em instrumento dessa classe, para proteger e assegurar os seus interesses materiais. E tem, pois, um conteúdo de classe.

Mas, e se me permitem o trocadilho, também aqui podemos fazer uma distinção entre justiça formal e material.

Do ponto de vista formal, não nos é possível falar de justiça sem recordar a Constituição da República Portuguesa, que refere que “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”. Fica então claro que o acesso ao Direito e à Justiça é um direito consagrado na nossa arquitetura constitucional.

Infelizmente, no país e na região, fruto da política de direita, assistimos a uma degradação das condições de acesso à justiça, situação que resulta do desinvestimento em meios infraestruturais, humanos e materiais.

O Algarve continua sem um Tribunal da Relação, não obstante ter já havido legislação a prever a sua criação. Contudo, essa legislação acabou revogada sem que este tribunal alguma vez tivesse saído do papel. Um tribunal da Relação na região permitiria uma maior proximidade entre os cidadãos e a justiça, até porque cerca de 1/3 dos processos julgados em Évora são provenientes do Algarve.

Não esquecemos, igualmente, que há cerca de 14 anos chegou a estar prevista a construção do Campus da Justiça de Faro. Iria juntar o conjunto dos tribunais dispersos pela cidade, mas também este projecto nunca saiu do papel.

Também os Julgados de Paz, experiência que se revelou positiva em muitas regiões, continua sem implantação no Algarve.

Em larga medida, e não obstante o avanço verificado com a criação de um Juízo do Comércio em Lagoa, continuam por reverter as medidas resultantes da então Nova Lei de Lei da Organização do Sistema Judiciário que, sob a capa de uma “especialização” dos Tribunais, veio sim afastar os Tribunais dos Cidadãos, obrigando-os muitas vezes a custosas deslocações para participar em diligências diversas.

Do ponto de vista dos meios humanos, são evidentes insuficiências. no que toca a magistrados, procuradores do Ministério Público, mas especialmente funcionários judiciais, ainda que com alguns progressos aqui e ali verificados. E parte do problema surge também com o recrutamento para a região, ficando muitas vezes por preencher vagas, o que não pode ser desligado dos custos de vida particularmente elevados associados à região, nomeadamente na habitação.

Quanto à falta de condições materiais, posso até pegar num exemplo prático e recordar uma informação de 23 de Novembro de 2022, num processo que corre no Tribunal da Comarca de Faro, onde podia ler-se o seguinte: "Faço constar que, uma vez que só muito recentemente foi rececionado neste edifício papel para fotocópia e desde então, devido ao elevado volume de serviço e diminuto numero de funcionários, ainda não foi possivel extrair a certidão do processo (...)" Poderia até ser uma qualquer rábula de um programa de humor, mas para aqueles que vêm a sua vida em suspenso por questões como esta esta situação preenche os requisitos de uma tragédia.

 

Camaradas

Não temos dúvidas que a luta de classes é determinante. Não alinhamos em teses reformistas que acreditam na possibilidade da transição ao socialismo por meio do direito. Mas não ignoramos, igualmente, que a qualidade técnica pode, no momento oportuno, fazer a diferença em várias batalhas.

É, por isso, que enquanto advogados comunistas, por exemplo, não deixamos de procurar intervir na nossa própria realidade. Bem conhecemos as muitas piadas que se fazem sobre Advogados. É atribuída a Lenine, ainda que de forma descontextualizada, a citação “Advogados? Nem os do Partido”. Mas, piadas à parte, sabemos hoje que a realidade de muitos advogados é diferente da que era há décadas. O crescimento do número de advogados, o recrutamento de juristas por empresas, para desenvolvimento de trabalho jurídico interno, na qualidade de advogados, e a contratação de advogados, tratados como associados, pelas sociedades de advogados, trouxe novos paradigmas laborais à advocacia. E, conscientes disso, temos procurado estar presentes nas lutas, também eleitorais, junto da Ordem dos Advogados e da Caixa de Previdência.

E é também por isso que não deixamos de apelar aos advogados, juízes, juristas e demais profissionais do sector, que reconhecedores do espírito emancipador do projecto de Abril, se unam a nós na construção de uma justiça que não esteja submetida aos interesses do capital.

E fazemos esse apelo agora com especial vigor, numa altura em que a discussão de uma nova revisão constitucional, agora promovida pelo Chega, mas a que o PS e PSD depressa corresponderam, ganha impulso. Apesar de considerarmos este processo desnecessário, e mais do que isso, condenável pelo seu propósito de subversão do regime democrático constitucional, não deixaremos de intervir com um projecto próprio que além de defender, vai no sentido de melhorar e aperfeiçoar o texto Constitucional.

Camaradas,

Podemos dizer que uma alteração no estado da justiça só será possível com uma ruptur com a política de direita. E por isso, o que urge é reforçar a necessidade de uma verdadeira política patriótica e de esquerda, que no respeito pela Constituição da República Portuguesa, promova, desde logo, o acesso de todos à justiça.

Viva a Xª Assembleia de Organização Regional do Algarve do PCP!
Viva o Partido Comunista Português!

 

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